Doutor Welson Tremura fala ao público em simpósio desprezado pelos organizadores do Fefol
É melhor que ainda não se deixem assoberbar os organizadores do 53º Festival do Folclore de Olímpia.
Pois este é o grande inimigo das pessoas e coisas feitas por elas, no que diz respeito à nossa festa maior. Por ora, todo trabalho feito pela Comissão Organizadora e a Secretaria de Cultura, pode ser classificado, por conta das circunstâncias, como uma espécie de “ato de contrição”, embora não sejam exatamente os “pecadores”.
Dito isso, espera-se que, para o ano que vem, ou para edições mais adiantes até – uma vez que a pouca atenção dispensada a evento tão importante em nível de Brasil vem de muito anos – haja uma volta à profundidade que o Festival anseia, conscientes de que o Fefol não deve ser só danças no palco. Aliás, mestre José Sant’anna quem dizia sempre, que as apresentações no palco eram o apogeu dos dias de Festival.
Doutora Tatiane fala ao público no mesmo Simpósio, suscitando depois profundo debate
E assim deve ser encarado se quisermos despertar novamente o interesse de pesquisadores, estudiosos, ou mesmo de curiosos em busca de informação e conhecimento. E só as danças não suprem esta característica.
‘MARATONA DE QUEM CONHECE MAIS’
Já não é de hoje que a grande preocupação no entorno da festa tem sido quantos grupos foram contratados, que grupos foram contratados, que grupo nunca veio, que grupo virá de novo, quantos folclóricos, quantos parafolclóricos, assemelhando-se a uma “maratona de quem conhece mais e melhores grupos”.
Certo que a seleção criteriosa de participantes é importante, mas não deve ser a única e principal preocupação, como se tem notado. E isso não é de agora. Teve anos ainda piores, onde as atrações cênicas mais se aproximavam do teatro musicado do que da representação folclórica necessária e sempre priorizada por Sant’anna quando da escolha dos parafolclóricos.
Este ano, a propósito da reintegração de um elemento-chave no âmbito das contratações, parece que houve uma ligeira guinada à busca da qualidade aliada à plasticidade de cena. Melhor que a qualidade tenha sido em maior grau.
Houve também um nível de respeito mais elevado em relação aos grupos folclóricos -embora, claro, manifestações individuais ou de grupos eivadas de preconceito e discriminação tenha-se presenciado em diferentes momentos.
SÍMBOLOS DA PERENIDADE
Então, o perigo que se impõe à nossa festa, é o da superficialidade, é o da ideia de que palanque basta e as programações constantes de todos os anos idem como símbolos de sua perenidade. Mas, que tal a preocupação com o aprofundamento disso tudo?
Nós temos tido a oportunidade de acompanhar uma programação que ainda não faz parte oficialmente da oficial do Folclore e que, a nosso ver, tem sido um desperdício de informação e transmissão de conhecimento: os simpósios étnicomusicais que há pelo menos três anos vêm sendo realizados por esforço de um olimpiense amante à toda prova de nosso Festival.
Por que não incorporar estes encontros ao Fefol, agregando a ele público, por exemplo professores da rede pública municipal e estadual, que depois poderiam usar em sala de aula com seus alunos, além de apenas lhes ensinar a dança, também lhes ensinando conceitos, formas, origens, e tudo o mais que permeia o tema?
PARA QUE O FEFOL FOI CRIADO?
E não só este tipo de simpósio. Há outras tantas ideias e assuntos que se encaixariam no dia-a-dia do nosso Fefol, fazendo com que as atividades, para muito além dos brinquedos tradicionais e infantis, sejam todos os dias, o dia todo. Dias de irradiação de conhecimentos e cultura, que afinal é para isso que o Fefol foi criado. E repensá-lo neste aspecto seria fundamental.
Personagem de um dos grupos de Moçambique mais constante no Festival de Olímpia
Vai dar mais trabalho, não restam dúvidas. Mas com certeza nosso evento ganhará, e muito, em prestígio, respeito e importância junto à Academia, imprensa -falo daquela imprensa que trata o tema com profundidade, nãos as inserções televisivas, não raro pagas e festivas.
Traria de volta aquele público que hoje abandonou nosso Festival: os pesquisadores acadêmicos ou não, os curiosos em busca de informação e cultura, instituições, entidades nacionais e internacionais de estudos do Brasil.
SALÃO DE EVENTOS
Também aí surge uma outra ideia, já que o prefeito Fernando Cunha falou em cobrir a arena do Recinto para “o povo não sentir frio”.
Considerando que o alcaide é engenheiro e deve saber muito bem em que conceito se insere a estrutura arquitetônica da arena, sugeriríamos que, ao invés disso, fosse aproveitada uma das barracas, com as devidas reestruturações, e transformada em um salão de convenções, simpósios, debates, onde todos os eventos extra-palco pudessem sem realizados, com conforto e segurança.
Claro, isso se houver a intenção de sairmos da mesmice a que o Fefol está mergulhado, de modo geral, e passarmos a tratá-lo, de novo, como um evento de cunho cultural, não apenas de espetáculos de dança, haja vista a pouca identidade da maioria dos grupos que para cá são chamados, com o fato folclórico, propriamente dito.
Hoje percebe-se um distanciamento maior, uma teatralização maior (no que o teatro tem de livre representação), um colorido às vezes absurdo, exagerado, não contando os elementos novos incorporados, sabendo-se que para alguns deles, com certeza, Sant’anna faria muxoxos e “rabo-de-olho” para quem estivesse do seu lado. Ele não admitia heresias. Grupos deixaram de ser chamados ou vieram apenas uma vez e não mais por conta disso.
DEDICAÇÃO MAIOR DO SITE OFICIAL
Outro aspecto a ser abordado, e este é muito grave. Não começou agora, não era nem nunca foi a praxe, mas para que nosso Festival consiga repercussão no meio acadêmico, dos pesquisadores, estudiosos, etc., assim até facilitando as negociações em busca de verba junto às esferas estadual e federal, é preciso que haja uma dedicação mais extremada com o site do Festival, que nos anos todos apenas tem servido para acomodar os releases sobre o evento.
Os Parafolclóricos, quando próximos do Folclórico, acrescentam sentido ao evento
Por exemplo, tivemos aqui, na sexta-feira, o simpósio já citado acima, no qual um dos palestrantes era nada mais, nada menos, que o olimpiense Welson Alves Tremura, doutor em musicologia-etnomusicologia nos EUA pela “Florida State University” (FSU), entre outras atribuições, que falou um pouco -e esse pouco valeu ouro, sobre Folclore, música, tradição e sua relação, enquanto brasileiro, com as muitas visões do estrangeiro sobre sua terra natal e suas manifestações culturais.
Também Tatiane Pereira de Souza, olimpiense neta de José Ferreira, capitão do Terno de Congadas Chapéu de Fitas, grupo que inspirou-a a iniciar pesquisas sobre africanidade e suas culturas, além de outros temas de caráter antropológico, agora cursando pós-doutorado na Unesp, e outras “feras” com portfólio acadêmico de fazer inveja a qualquer um.
E sabem para quantas pessoas falaram? Se muito, 15 abnegados olimpienses e integrantes de grupos. Ninguém da Comissão, ninguém da organização da festa, ninguém para colher ali rico material ilustrativo da essência do nosso festival, a fim de abastecer o site do Folclore com entrevistas, fotos, impressões de especialistas, por exemplo, material que repercute no mundo acadêmico e de pesquisas, e que precisa ser alcançado, para o bem de nosso Festival.
A organização e realização de tudo isso, às vezes dando “murro em ponta de faca”, “comendo o pão que o diabo amassou”, foi de outro olimpiense, Estevão Amaro dos Reis, músico com doutorado em Etnomusicologia na Unicamp. É preciso pegar rápido, com as duas mãos, este trabalho, incorpora-lo à programação oficial e a cada ano aprimorar mais, a fim de despertar novamente o interesse acadêmico, histórico e cultural da nossa festa.
CORREÇÕES À VISTA?
Não se faz aqui análises fáticas sobre a edição deste ano do Fefol. Melhor fazer esta “cobrança” por profundidade maior, já que é quase consenso ter tido esta edição resultados positivos no que diz respeito ao seu aspecto de festa, propriamente dito, embora os senões que certamente serão corrigidos para o ano que vem.
No aspecto estudos, discussões, debates, troca de conhecimentos e culturas, transmissão do ideário folclórico, porém, ficou a desejar. Não é culpa dos organizadores de agora. Esta situação vem num crescendo que, espera-se, agora tenha um fim. A considerar o esmero com que foi tratado o lado festa do Festival, é possível vislumbrar melhoras consideráveis no lado cultural.
Aproveitando que, parece, tem-se agora um prefeito que gosta do Festival. O último a demonstrar interesse e amor por ele já data de mais de 30 anos e nem entre nós está mais. Portanto, o 53º Fefol acendeu as luzes de todas as boas expectativas possíveis. Espera-se que não seja “fogo de palha” de principiantes.