Entre estupefato, estarrecido e incrédulo, encontrei na caixa postal na manhã de hoje e-mail oriundo da assessoria do Governo Municipal, cujo conteúdo traz o seguinte título: “Festival do Folclore de Olímpia abre inscrições para concurso da rainha e princesas da festa“. De imediato, me veio à mente aquela figurinha verde vomitando da internet. Sério. Porque é o que esta iniciativa merece: um vomitaço.
É impressionante a capacidade desta gente de querer transmutar as coisas “sagradas” do município a seu bel-prazer. E o verbo, se quiserem, pode ser usado no sentido químico, aquele que fala na transformação de um elemento químico em outro, com a condição de que já sabemos qual é o outro.
O leitor pode estar estranhando a falta de elegância derramada nesta introdução, mas estou transmitindo aqui a forma como recebemos as reclamações nas ruas por aí. Talvez entendam melhor, os senhores luminares do governo.
O texto abre com o seguinte parágrafo:
“O 53º Festival do Folclore da Estância Turística de Olímpia retomará, neste ano, a tradição do concurso para escolha da rainha da festa. A novidade é que também serão selecionadas a 1ª e 2ª princesas do festival.” Certo? Estavam sentindo falta delas, né, as acompanhantes da monarca?
O que causa espécie é que nesta altura do campeonato, quando todos que amam e respeitam o evento como difusor de cultura e conhecimento, conforme o legado de Sant’anna, esperavam as informações sobre o que se poderia esperar da festa este ano, em termos de conteúdo, porque o que se ouve por aí não é nada abonador, saem com essa.
Quer parecer que há uma excessiva gana “modernista” a rondar os organizadores, aquela “liberdade intelectual” nas escolhas e decisões sobre quem pode vir e quem não pode, e aquela displicência em não fazer esforço qualquer para convencer este ou aquele grupo a vir, mesmo o que vêm por conta própria como, parece, alguns estão desistindo.
Aí, gastam-se energia, tempo e recursos com algo tão frívolo e desnecessário quanto o tal concurso que nada, absolutamente nada, acresce ao Festival. E quer saber qual será a função destas garotas durante o evento? Muito bem, vamos lá:
“As eleitas serão as representantes oficiais da festa, tendo como obrigações, visitar os grupos durante a semana do festival, ser hospitaleiras, dar suporte e informações aos grupos a respeito da história e da programação do evento, entre outras. Além disso, deverão obrigatoriamente participar da abertura (5 de agosto), do 1º domingo (6 de agosto), e do desfile e encerramento do festival, no dia 13 de agosto.”
Porque sem elas nada acontecerá? É isso?
No quesito “visitar os grupos” já sabemos de antemão quais serão os preferenciais se não os únicos a terem o ar da graça das beldades folclorísticas. Vão participar “obrigatoriamente” da abertura, em 5 de agosto, do primeiro domingo, 6, e do desfile de encerramento que – outro pasmem-se! – deve ser levado para a Avenida Menina-Moça, como antes já fora, quando experimentou retumbante fracasso.
Aí nos vem à memória também a possível desativação da Vila Brasil e suas icônicas noites de verdadeira nostalgia de tempos idos. Então, que tal voltarem todas as tenções para estes detalhes, poupar vossas emoções para o que vale a pena, antes que nossas noites de palanque ou mesmo o desfile de encerramento fique mais com cara de carnaval fora de época – que as informações neste sentido também nos deixam com a pulga atrás das orelhas – que de manifestações das raízes culturais e históricas.
Em suma: vamos aprofundar o olhar e a mente e debruçar seriamente sobre o que há por fazer de responsável e comprometido com a história e cultura deste país
Temos esta responsabilidade. Não à toa somos a Capital Nacional do Folclore. É uma distinção que requer de nós, olimpienses, no mínimo discernimento para diferenciar o que é festa para encher os olhos, do que é festival para encher a alma e o intelecto.
Não sejamos injustos: há uma pergunta de profundo cunho cultural dirigida às incautas candidatas: “O que o Festival do Folclore de Olímpia representa para você?”. Só se espera que no dia do concurso não se interessem pelo prato preferido de cada uma delas.
Mas, falando sério, abaixo as firulas que se prenunciam. Respeitem o sono eterno de seu criador, professor e folclorista José Sant’anna.