Já havia postado aqui, também com base em material publicado pelo semanário “Folha da Região”, comentário a cerca da problemática ora instalada no entorno e no interior do prédio abandonado da Unidade Básica de Saúde-UBS, do Jardim Santa Ifigênia, cobrando a responsabilização de quem de direito, pelo estado em que hoje se encontra aquele imóvel público. Quais sejam, o prefeito municipal e sua secretária municipal de Saúde, por extensão. O prédio foi inteiro depredado, ficando numa condição na qual não se encotrava quando foi fechado para reforma.
Mas, o interessante a ser notado quanto ao jornal, está na forma de tratamento que vem dando ao assunto. Busca-se, ao que parece, a social-criminalização do fato, quando ele é, por suas características, perfeitamente político-administrativamente criminalizável. Sob o título pomposo de “A UBS e a impotência do Executivo”, editorial daquele jornal tenta transportar para Olímpia, em síntese, as características de uma situação que se vive hoje no Rio de Janeiro, onde o Estado busca recuperar os espaços perdidos nas comunidades de morro para o tráfico.
O título de capa “Autoridades não conseguem reaver prédio de UBS ocupado para uso e tráfico de drogas” é bastante revelador desta imagem “torta” que se tenta imprimir ao fato. Primeiro, que é inadmissível que autoridades constituídas do município não consigam “reaver o prédio”. Todos sabemos que, digamos, felizmente para a cidade, o tráfico ainda não alcançou proporções de grandes metrópolis, nem há que se falar em “ocupações” do que quer que seja, por seus praticantes. Justiça seja feita, embora com foco distorcido, o editorialista vai na jugular do Governo Municipal quando diz: “O poder público, (…) no tocante à UBS que foi fechada para futura reforma, extrapolou de sua incapacidade administrativa.”
Foi, também, correto ao adotar a linha de raciocínio já traçada por este blog, no post anterior “Prédio da UBS: que tal apurar-se responsabilidades?” (24/01), ao reforçar que “seria e é dever do Executivo cuidar de seus bens patrimoniais e outros com responsabilidade, porém não é isto o que está ocorrendo naquela UBS”. E mais ou menos acerta quando diz, por vias tortas, que o prédio nada tinha de tão ruim, que precisasse de uma reforma pela base, estrutural, como vai precisar agora.
Mas, falha completamente no seu “olhar jornalístico” o autor daquelas linhas, quando diz que “depredadores transformaram aquele espaço tão útil à população mais carente em um caos completo, abandonada que foi pelo poder público”. Porque coloca-se o poder público como mero ator passivo no caso, e os “depredadores” como os entes ativos, nocivos à “população mais carente”. Quando, o certo, seria inverter o grau da culpabilidade neste momento.
Depredadores, categoria cunhada pelo editorial, são os outros, ou são mais fortemente aqueles que têm o dever e o poder de cuidar, de preservar, e acima de tudo manter um bem público em plena atividade, e não o fazem?
A depredação física daquele próprio municipal é uma consequência do abandono, do desleixo, do pouco caso com o patrimônio público, e não a causa. Esta ocorreu porque antes houve uma outra, que chamaremos de depredação institucional no tocante ao prédio. E mais: o que pode trazer desconforto para a vizinhança, insegurança e medo, não são propriamente “as atitudes marginais que ali eram vistas durante a noite, e que a ousadia trouxe para a luz do dia”.
Todos esses estados do ser se mostram mais nítidos quando não há por perto destas comunidades, o Poder Público na figura das ações sociais de modo geral, com ênfase na saúde, o que é o caso. Estes milhares de seres em desconforto, inseguros e cheios de medo, tiveram suas rotinas cotidianas mudadas da noite para o dia, numa “penada” de quem se acha conhecedor e senhor de todas as aflições humanas.
Obrigados a buscar, a quase um ano, a atenção médica ou o aviamento de suas receitas a uma distância três, quatro, até cinco vezes maiores que antes, haja paciência para suportar tal situação.
Se “está tudo dominado”, como decreta o jornal, pouca importância isso tem para aqueles moradores dali. Qualquer sociólogo de banca de faculdade sabe que situações como essas são fatos comuns e inseridos naquele cenário, a tal ponto de nem gerar tanta indignação assim. Gera indignação, isto sim, aquilo que o editorialista diz logo depois: que o poder Executivo, que detinha aquele espaço público, “agora se mostra totalmente impotente para retomá-lo”.
Mas, esta retomada não deve ser aquela belicosa, a que alude o texto, a retomada “teritorial” pela força das armas. A retomada que se espera é a retomada moral do espaço, e administrativa de suas funções. Os depredadores estão lá porque encontraram espaço vazio, abandono, campo fértil. Quererão eles o confronto, ao bem da sociedade ali vivente? Quem aposta que quererão uma alternativa justa e resolutiva àquela atual situação?
Ao final, o jornal, em seu editorial, faz uma sinuosa digressão sobre o fato, insistindo em que, por ora, melhor seria “que outros poderes (…) sejam acionados” (O quê? Exército, Marinha, Aeronáutica, Tiro de Guerra?), para resolver uma situação que pode, “diante da confessada incapacidade de resolver o problema, se estender para outros (pontos da cidade)”.
E o pior é o diretor da Progresso e Desenvolvimento Municipal-Prodem, Vivaldo Mendes, vir endossar a “via dolorosa” traçada pelo jornal, ao afirmar em entrevista que a autarquia destacou um guarda para “inibir as situações constrangedoras que estão ocorrendo naquele próprio municipal”, mas os frequentadores dali “expulsaram o guarda de onde já consideram território seu”. Como assim?
Que me perdoe o editorialista, mas “situação constrangedora” é o abandono absoluto por que passa aquele próprio municipal. Situação constrangedora é sócio-criminalizar o que é, na essência, verdadeiramente político-administrativamente criminalizável. O que virá doravante – não sendo ação prática para varrer das nossas vistas tão lamentável situação – serão falácias.
Até.