Amanhã, 3, é o dia do voto. A data representa, antes de tudo, um alívio. Primeiro porque vamos ficar livres de tanto barulho, de tanta correria, de tanta falsidade, correndo para lá e para cá, num ir e vir infinito. Segundo, porque marcará o fim da talvez mais sórdida campanha eleitoral de que se tenha notícia neste país. Aliás, esta campanha eleitoral pode ser tranquilamente classificada como um golpe que não vingou. Um golpe na instituição da democracia e, portanto, declaradamente contra a vontade popular. Mas, estas eleições podem significar outra coisa, também, só que extremamente positiva: significará o dia em que o povo decidirá por si. Em que fará uma espécie de “revolução silenciosa”, uma revolução pelo voto.
E é isso, seguramente, o que tem enfurecido certo segmento das elites. Hoje pela manhã conversava, no centro, com um expoente político de Olímpia, figura conhecedora dos meandros da coisa, eis que circulou, por muitos anos, entre as “altas esferas” da política paulista. E ele dizia que o cenário que está por emergir das urnas, politicamente falando, não é dos mais animadores, na sua visão de mundo. Mas, ao mesmo tempo, ele também não soube apontar a qual mundo pertence, nem se a alternativa, ou seja, uma hegemonia tucana, seria o mundo ideal.
Na base argumentando que “toda unanimidade é burra”, ou usando de uma colocação acertadíssima do cineasta tucanérrimo Arnaldo Jabor, algo como “a inteligência fere, a burrice conforta” (cito de cabeça), tal figura estaria a sinalizar que algo não irá bem no futuro, caso o que se está delineando no horizonte político do país e do Estado – aliás dos Estados-, se concretizar. Poderão vir “solavancos”, intranquilidades, desassossegos que poderão redundar num estado, talvez, de exceção. “Porque eles não vão poder governar”, disse mais ou menos asssim nosso interlocutor.
“Eles”, no caso, são aqueles candidatos a serem escolhidos legitimamente pelo povo, por meio do voto, que desta vez preferiu um seu, digamos, “igual”, ou pelo menos mais próximo, para lhes conferir poder político e administrativo. E isso aquele segmento das elites não aceita. De maneira alguma. Quando o presidente Lula disse, em um comício em Minas Gerais, que “a opinião pública somos nós”, correu a imprensa a usar desta frase com sentido dúbio. Tentaram atribuir a esta fala do presidente um conteúdo que de fato, ela não tinha. O “opinião pública somos nós” de Lula tem razão de ser. Em sentido lato, ali estava a expressão verdadeira do que significarão os resultados esperados destas eleições: será a eleição em que os “formadores de opinião” não tiveram a menor influência. Por mais que tivessem tentado.
Significa que será uma eleição em que o povo votará “apartado” daquilo que tais segmentos das elites julgariam mais apropriado para o país, para o país “delas”. Daí toda a fúria. Daí todo tipo de ataque. Daí as mentiras, as falsas acusações, que não se sustentavam por 24 horas, daí as tentativas de torcer fatos, “parir” boatos e “verdades”, sempre gestados em corredores ou belas salas iluminadas da “intelligentsia” oposicionista. Ou devo dizer “politburos” às avessas? Alguns hão de argumentar, e com razão, que a imprensa cumpria seu papel, algumas denúncias tinham fundamento etc.
Daqui responderemos que sim, a imprensa, em pequena fração, cumpria seu papel. Mas, numa fração incomensuravelmente maior, fingia cumpri-la. Atacou virulentamente o presidente Lula e sua candidata, violentou princípios da ética jornalística, derrapou na lama do pensamento extremado, todos, como bem salientou o presidente, fingindo neutralidade, imparcialidade que de fato não existiam. Tanto, que horas depois da crítica mais contundente feita por Lula, e não sem antes, claro, os grandes veículos partirem para o ataque frontal – quando duas centenas de “formadores de opinião” chegaram até a fazer um “manifesto” público – o Estadão joga na cara de seu leitor que tem candidato. E que ele é o Serra.
Assim, assinando embaixo toda crítica recebida não só do presidente, mas de uma legião, milhões de twitteiros e blogueiros que formaram, até inconscientemente, a coluna de resistência contra o que se convencionou chamar de “golpismo midiático”. Foram eles que, o tempo todo, cobravam vigilância eterna, buscavam indícios de “golpe” aqui e ali, sempre denunciando quando algo, na grande imprensa, saia do “prumo”. E até por meio de ironias, conseguiam fazer com que milhões de pessoas se mantivessem de olhos bem abertos. E faziam, também, com que tais veículos se “coçassem” – a Folha, por exemplo, sempre reiterando, até em editorial, que era imparcial, índicio claro da “sinucada”.
Foram, portanto, as redes sociais uma importante ferramenta a garantir a livre e democrática manifestação político-eleitoral das massas, sem o “ruído” indisfarçado de um pensamento de direita, concentrado em torno de uma proposta, não de Governo, mas de poder, que é o perpetuum mobile, o moto-perpétuo da oposição, hoje representada por figuras incrustadas em agremiações como DEM e PSDB, de resto um ajuntamento anódino sem amplitude de pensamento. Seu próprio carro-chefe, o candidato Serra, encarnando essa imagem, intelectualmente limitado que é.
Pois bem, aquele meu amigo lá de cima, não disse exatamente e em claras palavras o que pensava, mas a linha do seu pensamento era perfeitamente captável: o temor de um país governado, em síntese, por um projeto de Governo com viés popular. Daí, pensamento-elite, para derivar para uma república “bolivariana” (as elites adoram fazer esta comparação), basta romper a “tênue linha” que imaginariamente separaria a real democracia (que eles também não definem exatamente o que é) de um estado “niilista negativo”.
Mas, confrontado no contraditório, aquele amigo arrefeceu. Também é incógnita, pois. Seria trocar um sistema de virtual absolutismo por outro, só que, no caso, resvalando para um direitismo que, da mesma forma, político-ideologicamente não se saberia no que iria redundar. Pois toda a unanimidade não é burra? Então, o pensamento único é o quê? E não era exatamente esse o melhor dos mundos para o Governo FHC? A massa, as elites, a mídia, as instituições, as instâncias de poder, todos pensando de acordo com o “grande irmão”, como único caminho traçado para a redenção?
Portanto, neste momento, só resta aos homens de bem deste país uma coisa: respeitar solenemente nossa Carta Magna, a “Constituição-cidadã”, forjada no suor de figuras ímpares de nossa política, alguns já nem mais entre nós, como Ulysses Guimarães, Mário Covas, Miguel Arraes, Tancredo Neves, Leonel Brizola e tantos outros, que tinham àquela época um projeto de país, diga-se de passagem, parecido, se não igual, com o que está em pleno desenvolvimento agora.
Nesta lista poderia ser incluído também FHC. Mas hoje ele é apenas um arremedo do que foi no passado. Lá ele também tinha um projeto de país. Que depois se transformou num mero projeto de poder. E aí ele negou toda sua história. Como nega agora, com esta campanha sórdida a sua história, o PSDB.
Até.
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